A criatividade é revolução, é resistência, é o motor da nossa identidade e da nossa economia. No Sul Global, as indústrias criativas, do cinema e da música à moda e às artes visuais, continuam a demonstrar que o talento não conhece fronteiras, mesmo que as barreiras financeiras e estruturais tentem limitá-lo. Encontramo-nos num momento crucial, repleto de grandes oportunidades e de demasiados desafios persistentes. É por isso que, neste post, gostaria de definir as tendências que estão a marcar o ritmo desta revolução criativa.
Microsséries: o futuro audiovisual na palma da sua mão
Na China, o microssérie abalaram a indústria do entretenimento. Concebidas para o consumo móvel e caracterizadas por uma narrativa rápida e finais chocantes, estas produções têm sido um sucesso estrondoso desde 2020. Plataformas como o Douyin (o TikTok chinês) têm sido fundamentais para a sua divulgação, tendo mesmo ultrapassado a tradicional bilheteira de cinema em termos de receitas. As grandes empresas tecnológicas estão atualmente a apostar neste formato, tendo aumentado a qualidade e exportado a tendência para todo o mundo.
O impacto já se faz sentir no Ocidente, com aplicações como a ReelShort, que publica vídeos verticais de dramas românticos, a ganharem popularidade nos EUA. Estas plataformas competem com gigantes como a Netflix nos descarregamentos, o que comprova a mudança de hábitos de consumo: rapidez, acessibilidade e entretenimento imediato.
Onde está o investimento? África vs. América Latina
Embora o formato curto esteja a ganhar terreno, o financiamento da criatividade continua a revelar desigualdades geográficas. Em ÁfricaAssistimos a uma redução preocupante do investimento de plataformas como a Netflix e a Amazon, que estão a dar prioridade a mercados mais desenvolvidos na Europa, Ásia e América Latina. Isto deixa a indústria criativa africana com a tarefa urgente de encontrar novas fontes de financiamento e visibilidade global.
Em contrapartida, a América Latina destaca-se por atrair investimentos de milhões. A HBO Max, por exemplo, decidiu investir fortemente nas telenovelas brasileiras, revitalizando um género que sempre foi um pilar da cultura latina. Estes investimentos não só impulsionam as economias locais, como também diversificam os conteúdos globais e expandem as narrativas do Sul Global na esfera mediática internacional.
África brilha na cena cinematográfica
Apesar dos desafios financeiros, os talentos africanos continuam a despontar e a deslumbrar nos festivais internacionais. No Berlinale 2025, foram selecionadas várias produções do continente, realçando a diversidade e a riqueza das nossas histórias. Filmes do Egito, do Senegal e da República Democrática do Congo obtiveram reconhecimento, confirmando que o cinema africano não só está presente, como exige ser ouvido.
E não ficamos por aqui. Duas produções africanas foram selecionadas para os Óscares de 2025: O Último Ranger África do Sul e Dahomey do Senegal. Estas nomeações não são apenas um motivo de orgulho, mas também uma abertura de portas para futuras colaborações, financiamentos e, acima de tudo, para uma maior presença do cinema africano na conversa global.
Financiamento: um desafio a vencer
O financiamento continua a ser um grande obstáculo para muitos criadores independentes do Sul Global. As vias tradicionais de investimento são limitadas, obrigando-os a procurar alternativas mais inovadoras. Desde plataformas de crowdfunding a parcerias com ONG e colaborações internacionais, cineastas, designers e artistas estão a encontrar formas de concretizar a sua visão. No entanto, é fundamental que existam estratégias claras e redes de apoio para os ajudar a navegar neste complexo panorama financeiro.
Para onde é que vamos?
Estamos num ponto de viragem. Enquanto as microsséries e os investimentos na América Latina reflectem o dinamismo da economia criativa, o declínio do apoio financeiro em África recorda-nos que ainda há muito trabalho a fazer. Os governos, os investidores e as principais partes interessadas devem reconhecer o valor da criatividade e promover ecossistemas sustentáveis onde o talento não só sobrevive, mas prospera.
A criatividade é a força vital das nossas culturas e o futuro das nossas economias. É tempo de o Sul Global ocupar o seu lugar na narrativa global, não como um ator secundário, mas como protagonista da sua própria história.